5 de julho de 2010

Cabides humanos



Cabides humanos
maria da graça almeida

A ditadura da moda
-com o troféu da abstinência,
no pódio da desnutrição-
cerceou a naturalidade
das meninas que nas praças
comiam pipoca,
tomavam sorvete.

Montanhas de ossos
cruzam as passarelas.
Ao invés do glamour,
tão-só a anorexia
que amordaça
a liberdade de viver
sob os próprios moldes
da melhor idade.

Os olhos fixos no nada
amparam-se na maquilagem
que lhes camufla as olheiras.
Sobre pernas descarnadas,
num cruel exercício,
a juventude macilenta
e esquelética bamboleia.

Poeta do silêncio



Poeta do silêncio
maria da graça almeida

Sou poeta do silêncio,
da tortura, do tormento,
das ciladas, das caladas,
da mudez e do lamento.
Sou poeta vagabundo,
da mentira poeirenta,
que sorveu a gota insossa
de uma língua sonolenta.

Sou poeta -dos sem lida,
dos sem glória, dos sem nada-
que emprestou sua ternura
a uma lua mascarada.
Sou poeta da procura
e das letras apagadas
e no céu quando estiver,
declamarei do eu poeta
com a voz do eu mulher,
pois a minha fala esperta,
sem medida, imodesta,
dirá só o que Deus quiser.