31 de janeiro de 2013


 

 Verbo ser

maria da graça almeida

A vida que nascia escondida,  sob o  gerânio e as  cravinas,

não era  feito a que se via  no alto das árvores ressequidas.

 O ser que no baixo se  avistava

 desconheceria a inebriante vertigem da altura.

 Era uma nova vida que apesar da beleza do leito natal, 

 cama reflorida, explodia em vitalidade rastejante, 

gosmenta e asquerosa.

 O mesmo não se diria do outro vivente 

que entre palhas, capim e galhos secos

-tosca e rude ambientação -

mais  tarde experimentaria, nos céus,  

as delícias dos largos e audaciosos vôos.

 

 Era a surpresa dos desabrochares;

 era o conflito da beleza plena com a repugnância total;

um embate de quem olhava apenas o ali, o agora,

com  quem  vislumbraria o adiante, o depois.

 Era o soluço de quem nada seria,

respondendo ao sorriso de quem tudo teria.

 

 E nesse fim de tarde atoleimado,

 quando o nada a fazer dispôs-me às observações inúteis,

  minhas divagações levaram-me a perceber 

que a tempestade e a bonança de uns e outros

já  foram retratadas por pares e pares

de olhos curiosos e, sobretudo, desavisados,

   não cientes de que as fotografias não são eternas, 

 mas, enquanto forem visíveis, serão imutáveis.

O que é independe da nossa força, vontade e fé.

O que é será sempre como sempre foi.

 O que é sempre será.