7 de maio de 2010

Alguém para me ouvir


Alguém para me ouvir
maria da graça almeida

Hoje, eu sei o motivo de tanta terapia...
Não mais há ouvidos que ouçam,
se não os devidamente remunerados,
afinal, há um novelo em cada garganta
e um engasgo geral.
Será que as pessoas ficaram insensíveis?
Será que o tempo, no tempo, encurtou?
Será que a distância, com a distância, aumentou?
Ou será que a indiferença é a tônica da questão?
Hoje queria sentá-los na cama, como se ainda fossem
pequenas crianças, e dizer-lhes:
ouçam, prestem atenção, quero falar, escutem,
escrever só não me basta, é como se eu falasse sozinha,
não há resposta, não há uma voz, não há um som, não há troca.
Um desabafo por escrito não recebe a benevolência
de um gesto de amor, de um olhar afetuoso,
de uma palavra doce. Meu escritor aqui escreve
por falta de opção, por não ter com quem dividir
as expectativas, a ansiedade, o medo, a reflexão.

Deus! Tanto choro escutei, com paciência e mansidão;
tantas lágrimas aparei, com inexperientes mãos.
Será tão difícil ouvirem sem criticar,
escutarem sem agredir, calarem-se para ouvir-me?
O que incomoda a mim, pra vocês, eu sei, é bobagem
e o que os incomoda, para mim, saibam, é martírio.
Este é o diferencial, porém, quando suas
gargantas estiverem presas por falta de quem os escute,
falem comigo, pois, se eu não mais tiver a carnal condição de ouvir,
terei toda vontade astral de suas mágoas tentar reduzir.