7 de dezembro de 2010

Antes e depois

Antes e depois
maria da graça almeida


O antes, do derredor, é a influência;
o depois é o que sobra da essência.

O antes, do caso, é a antecipação;
o depois é o caso consumado.
O antes e o depois, da moeda, são os lados.

O antes, do fato, é pura ausência;
o depois é mera consequência.

O antes, da ocorrência, é o pressuposto;
o depois é tudo o que permanece no gosto.

O antes tão só é a efervescência,
pese-o bem, para que, no depois,
não lhe pese a consciência.

Preciso dizer

Preciso dizer
maria da graça almeida


Não retenha ou represe

os ditos em minha garganta,

nem no peito os meus soluços;

a tranca é um corte no pulso;

a mudez é poço vazio;

a chave, o jazigo mais frio.


Não me aprisione as letras,

nem me esconda o dicionário,

o dizer não possui cadeado,

o sentir já é nó desatado.


Não me ameace o verso

com espinhos ocultos,

a dor é um grão submerso

nos mares dos velhos insultos.


Não me provoque com suas loucuras,

hoje, finjo crer em falsas procuras

e só as desarmo com simples ternura,

posto que a poesia é a figura,

que impune inda flutua

nas amargosas águas

das doces amarguras.


Não queira que me mova

tão só entre seus pontos,

que repinte seus traços,

que reconte seus contos.

Meu rumo é um desaponto?

Cada qual pisa os passos

com largueza, sem percalços.


Deixe que, livre, fotografe

com a lente que mesma eu puser,

responderei pelo mal, se um dia o fizer,

pois que ninguém jamais conduzirá a brisa

que, brejeira, bailando vem,

nem a bobice do vento mais forte

que só leva a poeira aos olhos de alguém.