Preciso dizer 
maria da graça almeida 
Não retenha ou represe 
os ditos em minha garganta, 
nem no peito os meus soluços; 
a tranca é um corte no pulso; 
a mudez é poço vazio; 
a chave, o jazigo mais frio. 
Não me aprisione as letras, 
nem me esconda o dicionário, 
o dizer não possui cadeado, 
o sentir já é nó desatado. 
Não me ameace o verso 
com espinhos ocultos, 
a dor é um grão submerso 
nos mares dos velhos insultos. 
Não me provoque com suas loucuras, 
hoje, finjo crer em falsas procuras 
e só as desarmo com simples ternura, 
posto que a poesia é a figura, 
que impune inda flutua 
nas amargosas águas 
das doces amarguras. 
Não queira que me mova 
tão só entre seus pontos, 
que repinte seus traços, 
que reconte seus contos. 
Meu rumo é um desaponto? 
Cada qual pisa os passos 
com largueza, sem percalços. 
Deixe que, livre, fotografe 
com a lente que mesma eu puser, 
responderei pelo mal, se um dia o fizer, 
pois que ninguém jamais conduzirá a brisa 
que, brejeira, bailando vem, 
nem a bobice do vento mais forte 
que só leva a poeira aos olhos de alguém.
 
 
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